Olá pessoal do Porão Literário! Hoje vou compartilhar com vocês uma entrevista feita com Maurizio Ruzzi, autor de "Quarentena: Contos Isolados"
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1. O título do livro reflete uma experiência coletiva intensa e recente. Como foi o processo de transformar as emoções e os eventos da pandemia em literatura? Algum conto nasceu diretamente de algo que você viveu pessoalmente durante esse período?
Do ponto de vista literário, foi uma experiência que me ensinou muito. Era óbvio para todos que a pandemia "rimava" com literatura. Basta lembrar quantas coletâneas de contos sairam sobre o tema. Meu livro, por sinal, deve ter sido o primeiro no mundo a ficar pronto, e fiz tudo sozinho. O livro estava já pronto em Maio de 2020. O processo de edição infelizmente foi mais lento do que eu esperava, e o livro saiu só em Setembro.
Ainda assim foi um dos primeiros livros publicados. Mas, voltando no ponto, todos tínhamos essa sensação de estar entrando no desconhecido, e ao mesmo tempo tínhamos essa certeza que desse desconhecido sairia boa literatura. Isso tudo para mim evidencia a relação simbiótica entre vida e literatura. Uma precisa da outra. Finalmente, não, não vivi nenhuma dessas situações. Dois contos se baseiam de alguma forma em alguma notícia que vi, mas a conexão não é tão direta assim, ou ao menos não esgota as ideias do conto em questão.
2. Os contos em Quarentena — Contos Isolados dialogam profundamente com o cotidiano, mas também flertam com o insólito e o absurdo. Como você decidiu o tom narrativo que essas histórias assumiriam? Há um equilíbrio que você tenta alcançar entre realidade e ficção?
Ótima pergunta, principalmente porque não tenho ideia da resposta. A realidade flerta muito mais com o absurdo do que normalmente nos damos conta. Muitas vezes o absurdo só aparece quando olhamos as coisas em mais detalhe. Eu não gosto de procurar pelo absurdo, mas por outro lado gosto de encontrá-lo por aí.
3. Um dos elementos mais marcantes da sua escrita é o uso da ironia e do sarcasmo. Em sua opinião, qual é o papel desses elementos para provocar reflexão em meio a situações tão dramáticas como as abordadas no livro?
A resposta já veio com a pergunta: ironia e sarcasmo _provocam_ reflexão. Agora que você trouxe o assunto, essa frase me parece alguma lei universal que estava esperando para ser escrita. No meu texto, até onde sou capaz de me auto analisar, esses elementos aparecem naturalmente.
4. A coletânea lida com aspectos universais da pandemia, mas também tem um forte contexto local, que muitos brasileiros vão reconhecer. De que forma você acredita que a literatura pode eternizar eventos históricos recentes, especialmente quando vistos sob uma perspectiva local?
Essa é a definição de literatura universal, a capacidade de eternizar sensações e conceitos. E isso normalmente passa pela perspectiva local, seja de qual local for. Essa perspectiva dá os contornos, dá a moldura, mas a estrutura das relações é a estrutura humana. É muito fácil encontrar autores gregos clássicos fazendo algo absolutamente local. Andando para frente no tempo alguns milênios, um autor como Gogol faz literatura estritamente local (ele pode sair de São Petersburgo ou de Moscou, mas seu horizonte literário não sai da Rússia). Ninguém vai discutir a universalidade desses autores.
Dito isso, o Quarentena tem alguns textos com ambientação bem brasileira, mas outros que passam muito longe disso.
5. Ficção científica é um gênero com muitas vertentes, desde distopias sombrias até aventuras tecnológicas. Como você definiria a sua abordagem dentro do gênero? Há planos para expandir os universos criados nesses contos ou mesmo explorar novas histórias com temas semelhantes?
Todo o extremo traz novas possibilidades, disso não há dúvida. Agora, possibilidades narrativas é um conceito amplo. Se pensarmos em ideias, situações inusitadas, aí a resposta é obviamente sim, meu próprio livro é um exemplo disso, e, sem ser hipócrita, me orgulho bastante dele.
Mas de um ponto de vista mais amplo, de técnica ou abordagem narrativa, a coisa complica um pouco. Não vejo nenhuma nova fronteira ser explorada pós pandemia, aliás não vejo novas fronteiras bem exploradas faz muito tempo. Claro, tem muita gente experimentando coisas por aí. Ninguém me convenceu.